sábado, 17 de abril de 2021

Uma mulher brilhante e brava

"O lavrador perspicaz conhece o caminho do arado".
Homenagem a Oscar Barboza Souto, antigo lavrador, garimpeiro e comerciante.
In Memoriam.

No início de 2020 foi anunciado o lançamento do filme “Radiaoctive”, sobre a cientista Marie Curie. A previsão de lançamento para o fim do primeiro semestre não se concretizou por causa da pandemia do coronavírus.

Finalmente, neste mês, o filme foi colocado à disposição dos assinantes pela Netflix. Ontem, assisti ao esperado filme na TV.

Fiquei com a impressão de que a diretora da obra cinematográfica se propôs a apresentar a trajetória da cientista, sob o prisma de duas considerações adicionais: dar ênfase aos dramas enfrentados pela senhora Curie; e fazer a apologia da necessidade de empoderamento da mulher para que ela vença os desafios da histórica desigualdade em relação ao homem.

Citaria alguns fatos, dentre vários outros do filme, que me levaram a essa percepção:

     a insistência nas dificuldades de Curie supostamente por ser mulher — a rigor, as dificuldades existiram, mas a notável senhora era tão superior que tornou-as menores e jamais permitiu que a impedissem de rumar para a glória;

     a forma um tanto demeritória como foi tratada a premiação de Curie, com o prêmio Nobel de Física, o primeiro a ser ganho por uma mulher; 

     a omissão da maioria das viagens de Curie à Polônia, aos Estados Unidos e até mesmo ao Brasil; e

     a omissão ao fato de que a família Curie (e que família! ...) é detentora de seis prêmios Nobel, dois da própria Marie Curie; um de seu marido, Pierre Curie, em parceria com a esposa; um de sua filha Irène Curie; um de seu genro, Frédéric Joliot-Curie, em parceria com Irène; e um do outro genro, Henry Richardson Labouisse Jr, casado com Ève Curie, a outra filha.

 Enfim, em “Radioactive”, assistimos a aspectos relevantes da trajetória de Curie, permeados por uma enfatizada sequência de dramas. A grandiosa Marie Curie — seguramente a Einstein feminina da Ciência — merecia uma obra cinematográfica grandiosa. Para ser enfaticamente redundante, eu preferiria uma epopeia épica sobre uma das mais bravas e brilhantes mulheres, dentre as bravas e brilhantes da História.

Esse juízo de valor não é absurdo uma vez que a diretora do filme, Marjane Satrapi, é iraniana — oriunda de uma família com envolvimento no socialismo e comunismo, antes da revolução islâmica — e foi submetida ao autoritarismo de seu país, impactante na população em geral, mas sobretudo opressor das mulheres, que afora os preconceitos históricos atinentes a costumes daquela sociedade, tem preceitos constitucionais que, de forma inequívoca, colocam a mulher, de forma institucional, em posição inferior.

Feitas essas restrições — e apesar delas — aos apreciadores da sétima arte que puderem, recomendo que assistam ao filme. Até uma obra controversa não tira o mérito, a excelência e a grandeza de quem se dispôs a participar, na área de Saúde, da Primeira Guerra Mundial, empregando os pioneiros e perigosos equipamentos de Raio-X para salvar guerreiros e, nesse contexto, ofereceu a própria vida — inicialmente, arriscada nas pesquisas que a levaram à descoberta da radioatividade — para melhorar o mundo das futuras gerações.


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Transcrição do texto que divulguei no Facebook em 2020.
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Uma mulher extraordinária e o prêmio Nobel
A cientista Marie Curie, polonesa, naturalizada francesa, pode ser considerada a Einstein feminina. Sua extraordinária trajetória científica estendeu-se de forma direta e eficaz para a arte da guerra. Ela morreu por causa dessa contribuição. A família de Marie Curie é detentora de 6 prêmios Nobel, assim especificados:
– Marie Curie ganhou o Nobel de Física, em 1902;
– Marie Curie foi lareada com o Nobel de Química, em 1911, tornando-se o único cientista da História a ganhar dois prêmios Nobel, em duas áreas distintas da Ciência;
– Pierre Curie, ganhou o Nobel de Física, em 1902, em parceria com a esposa, Marie Curie, e com o cientista Henri Becquerel;
– Irène Joliot-Curie ganhou o Nobel de Química em 1935;
– Frédéric Joliot-Curie foi laureado com o Nobel de Química, em 1935, em parceria com a esposa Irène Joliot-Curie;
– Henry Richardson Labouisse Jr, marido de Ève Curie (segunda filha de Marie Curie), como dirigente da UNICEF, foi laureado com o prêmio Nobel da Paz.
Os outros ganhadores de duas láureas foram:
– Linus Pauling — de Química, em 1954, e da Paz, em 1962 (o segundo, fora portanto do campo da Ciência);
– John Bardeen, em 1956 e em 1972 — ambos em Física; e
– Frederic Sanger, em 1958 e em 1980 — ambos em Química.
Marie Curie cunhou o termo radioatividade, descobriu técnicas para isolar isótopos radioativos e descobriu dois elementos, o polônio e o rádio.
Durante a Primeira Guerra Mundial, fundou os primeiros centros militares no campo da radioatividade.
Marie Curie “morreu em 1934, aos 66 anos, em um sanatório na França, por causa de leucemia contraída pela exposição a radiação ao carregar testes de rádio em seus bolsos durante a pesquisa e ao longo de seu serviço na Primeira Guerra, quando montou unidades móveis de raio-X”.
Detalhes sobre a cientista podem ser encontrados em:
(i) Naomi Pasachoff, “Marie Curie and the Science of Radioactivity”, Oxford University Press, 1996; e
(ii) Robert Reid, “Marie Curie”, New American Library, 1974.

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