sábado, 1 de agosto de 2020

Antecipação de Aléssio


"O lavrador perspicaz conhece o caminha do arado".
Homenagem a Oscar Barboza Souto, antigo lavrador.
In Memoriam.


O QUE ALÉSSIO

 

Poema de Carlos Drummond de Andrade

(com adaptações de Aléssio Ribeiro Souto, resultantes de brincadeiras indevidas)

 

A voz lhe disse (uma secreta voz):

— Vai, Aléssio, ver.

Vê e reflete o visto, e todos captem

por teu olhar o sentimento das formas

que é o sentimento primeiro — e último — da vida.

 

E Aléssio vai e vê

o natural das coisas e das gentes,

o dia, em sua novidade não sabida,

a inaugurar-se todas as manhãs,

o cão, o parque, o traço da passagem

de pessoas na rua, o idílio

jamais extinto sob as ideologias, a graça umbilical do nu feminino,

conversas de café, imagens

de que a vida flui como o Sena ou o Aquidauana

para depositar-se numa folha 

sobre a pedra do Rochedo

ou para sorrir nas telas clássicas de museu

que se sabem contempladas

pela tímida (ou arrogante) desinformação das visitas,

ou ainda para dispersar-se e concentrar-se

no jogo eterno das crianças.

 

Aí, as crianças... Para elas,

há um mirante iluminado no olhar de Aléssio

e sua objetiva.

(Mas a melhor objetiva não serão os olhos líricos [de Aléssio])

 

Tudo se resume numa fonte

e nas três menininhas peladas que a completam,

soberba, risonha, puríssima foto-escultura de Aléssio,

hino matinal à criação

e à continuação do mundo em esperança.

 

[Carlos Drummond de Andrade fez a apologia do Aléssio seu e antecipou alguma coisa do outro Aléssio]

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