segunda-feira, 2 de março de 2015

Cômico se não fosse trágico

[Mensagem acolhida e divulgada no Fórum de Leitores eletrônico do Estadão de 27/03/2015]
O excelente artigo “Aqui nas nossas barbas” (“Estadão”, 25/2, A6), da sra. Eliane Catanhêde, analisa as interações do governo brasileiro com a madura Venezuela, em célere marcha para um cenário degenerative, e por extensão constitui-se em emblemático estímulo para a reflexão sobre as andanças de nossa trajetória político-institucional.

Nesse sentido, aduziria que é oportuno visitar mestre Rui Barbosa, que afirmara em conferência na Associação Comercial do Rio de Janeiro, por ocasião de sua campanha presidencial: “Mentira toda ela. Mentira de tudo, em tudo e por tudo. Mentira na terra, no ar, até no céu, onde, segundo o padre Vieira (que não chegou a conhecer o sr. …….), o próprio sol mentia ao Maranhão, e direis hoje mente ao Brasil inteiro. Mentira nos protestos. Mentira nas promessas. Mentira nos programas. Mentira nos projetos. Mentira nos progressos. Mentira nas reformas. Mentira nas convicções. Mentira nas transmutações. Mentira nas soluções. Mentira nos homens, nos atos e nas coisas. Mentira no rosto na voz, na postura, no gesto, na palavra, na escrita. Mentira nos partidos, nas coligações e nos blocos (...) Mentira nas eleições. (...) Mentira nas candidaturas. (...) Mentira nas responsabilidades. Mentira nos desmentidos. A mentira geral. O monopólio da mentira”. Chega!

Sócrates, o grego da cicuta, perguntaria: “Mas, estaria o profeta baiano se referindo à compra da refinaria de Pasadena? Ou seria sobre a esticada da comitiva presidencial em Lisboa no retorno ao Brasil? Teria a desmontagem da candidatura da Marina alguma coisa que ver com isso? Não estaria falando o profeta sobre as notícias veiculadas pelo governo sobre a (des)pujança da economia brasileira? Seria sobre a indigência da educação pública no Brasil? Ou sobre a pobreza do apoio médico brasileiro, com questões estruturais que jamais seriam solucionadas com o programa Mais Médicos? Poderia ser sobre os investimentos brasileiros nas ditaduras americanas e africanas? Haveria de ser pelo apoio dos mensaleiros à reeleição do ano passado? Ou sobre o apoio dos petroleiros, esses que estão trancafiados por um magistrado do Estado do Paraná? Ou quem sabe sobre a propalada alegação de desconhecimento da agência Moody’s sobre a situação da Petrobrás? Será que a sra. Catanhêde poderia esclarecer? Profeta! Articulista! Eu só sei que nada sei; é isso que eu propugnava?”.

Aí apareceria Aristóteles asseverando, com mais um silogismo: “SE as indagações do sábio Sócrates sobre as assertivas do profeta Barbosa forem respondidas afirmativamente; e SE arquitetura da civilização ocidental desencadeada pelo sábio Platão estiver sendo propositalmente contrariada; ENTÃO a verdade, a liberdade, a decência e a justiça estão sendo conspurcadas no Brasil e, como corolário, as preocupações da sra. Catanhêde estão justificadas e o perigo tem endereço certo”.

Como seria divertido brincar com as reflexões dos moços de Atenas sobre a realidade brasileira! Como seria cômico, se não fosse trágico – tragédia expressa em crônicas antecipadas de insucessos garantidos, inequívocos, cristalinos. Mas os brasileiros relutam em ver – pelo menos, desde a conferência do estadista Rui Barbosa, na Associação Comercial do Rio de Janeiro, em 1919!

E a oposição? Bem a base aliada paradoxalmente tornou-se oposição de si própria, dificultando a atuação dos opositores. Não é incrível este país chamado Brasil? Quem sabe a sra. Catanhêde poderia apelar para o sr. Aécio. Ora, diante do cabelo inexcedivelmente bem talhado e do sorriso suave e enigmático da apelante – não cito a Mona Lisa porque ela não é tão bonita; que venha para cá um da Vinci! –, o mineiro poderia escorregar nas malhas dos encantos do apelo. E agir. Ação! Ação! Oposição! [Ação ainda que tardia ou antes que seja tarde demais; ou antes que se imponha a reação!].

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